7.2.17

Um chamado à luta criptográfica


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Antes de tudo, lembre-se de que os Estados são sistemas através dos quais fluem as forças repressoras. Facções de um Estado podem competir entre si por apoio, levando ao fenômeno da democracia aparente, mas por trás dessa fachada se encontram, nos Estados, a sistemática aplicação - e fuga - da violência. Posse de terras, propriedades, arrendamentos, dividendos, tributações, multas impostas por decisão judicial, censura, direitos autorais e marcas registradas, tudo isso se faz cumprir por meio da ameaça de aplicação da violência por parte do Estado.

Em geral nem chegamos a nos conscientizar de quão próximos estamos da violência, porque todos nós fazemos concessões para evitá-la. Como marinheiros a favor do vento, raramente percebemos que, abaixo da superfície visível do nosso mundo, se esconde uma grande escuridão.

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O novo mundo da internet, abstraído do velho mundo dos átomos concretos, sonhava com a independência. No entanto, os Estados e seus aliados se adiantaram para tomar o controle do nosso novo mundo - controlando suas bases físicas. O Estado, tal qual um exército ao redor de um poço de petróleo ou um agente alfandegário forçando o pagamento de suborno na fronteira, logo aprenderia a alavancar seu domínio sobre o espaço físico para assumir o controle do nosso reino platônico. O Estado impediria nossa tão sonhada independência e, imiscuindo-se pelos cabos de fibra óptica, pelas estações terrestres e pelos satélites, iria ainda mais longe, interceptando em massa o fluxo de informações do nosso novo mundo - a sua própria essência -, ao mesmo tempo que todos os relacionamentos humanos, econômicos e políticos o receberiam de braços abertos. O Estado se agarraria como uma sanguessuga às veias e artérias das nossas sociedades, engolindo sofregadamente todo relacionamento expresso ou comunicado, toda página lida na internet, todo e-mail enviado e todo pensamento buscado no Google, armazenando esse conhecimento, bilhões de interceptações por dia, um poder inimaginável, para sempre, em enormes depósitos ultrassecretos. E passaria a minerar incontáveis vezes esse tesouro, o produto intelectual privado coletivo da humanidade, com algoritmos de busca de padrões cada vez mais sofisticados, enriquecendo o tesouro e maximizando o desequilíbrio de poder entre os interceptores e um mundo inteiro de interceptados. E, então, o Estado ainda refletiria o que aprendeu de volta ao mundo físico, para iniciar guerras, programar drones, manipular comitês das Nações Unidas e acordos comerciais e realizar favores à sua ampla rede de indústrias, insiders e capangas conectados.


Julian Assange